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Foto do escritorFernanda Trigo Costa

Era uma saia de malha rodada

Hoje eu me lembrei que adorava usar aquela saia rodada de malha branca estampada com corações vermelhos.


A menina de saia que pulava do sofá queria que a saia se enchesse de ar. Queria ter a sensação de quase flutuar, enquanto chegava lentamente ao chão. E sentia que flutuava. Repetia o salto inúmeras vezes, tentando pular mais alto e cair bem devagar, retendo o máximo possível de ar naquela malha mágica que demorava a tocar novamente suas pernas.


A menina que usava a saia com a estampa de corações mal sabia que, um dia, aquela saia ficaria pequena, com minúsculos furinhos e não seria mais adequada para ser usada, nem mesmo para flutuar.


Com o tempo, a menina iria se acostumar a ficar sem a saia, a deixar de pular, a não mais sentir o ar preso na malha

a segurá-la para cair mais devagar.


Saltou em outros momentos. Foi aprendendo a cair e compreendendo que cair sem a saia também poderia ser um tipo de brincadeira, mas que, muitas vezes, iria doer.

Ficar sem a saia foi resultado de um cuidado de alguém, preocupado com a menina. Perdeu a saia, mas foi ganhando outras memórias, vivências, mágoas, alegrias, angústias... Ao longo do tempo foi se esquecendo de pular para flutuar.


E a menina com a saia foi se guardando num lugar escondido, sem poder saltar por não ter espaço.


Mas hoje eu me lembrei da menina e de onde ela estava.

Abri uma pequena frestinha e, muito rapidamente, ela saltou.


Enquanto eu estava de olhos fechados, ela agarrou a minha mão, me olhou carinhosamente e me puxou para pular do sofá com ela. Fomos caindo juntas, lentamente, enquanto a saia nos segurava até chegarmos ao chão. Fui revivendo tantas boas lembranças, tantos motivos para eu ter vivido tudo o que eu vivi, tantas conexões com quem eu sou hoje. Relembrei de um sem números de sonhos e desejos que ainda não realizei.


Ao abrir os meus olhos, eu já estava no chão, com o rosto coberto por lágrimas e o coração cheio de esperança. Ao olhar pro lado, ela estava lá. Segurou forte na barra da minha calça, determinada a ficar. Eu consenti e entendi que ela estivera todo esse tempo no mesmo lugar onde eu havia colocado as minhas vestes de filha, minhas necessidades de ser cuidada.


Passamos o resto do dia juntas, fomos ao parque com os filhos, fizemos as tarefas de rotina, jantamos com o marido e, antes de eu me render ao cansaço, ela me lembrou de que enquanto saltávamos juntas me veio uma vontade enorme de registrar nosso momento.


Então paramos por alguns minutos.

E fiz esse texto.

Uma cuidando da outra.

Uma curando a outra.

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