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Ancestralidade: vida morte vida

Foto do escritor: Fernanda Trigo CostaFernanda Trigo Costa

“Em 90 dias ela estava só.

Só, em meio a tantas pessoas.

Ela não tinha mais ninguém no plano terrestre que a conhecesse tão bem, tão profundamente. Havia perdido sua história, sua origem, seu maior querer bem.

Ao acordar, era como se seu coração partisse em mil pedaços, ao perceber, no abrir dos olhos e retomada da consciência, de que não era um sonho ruim. A mãe realmente não estava nem no quarto, nem na sala, nem na cozinha ou no quartinho de costura.

A mãe também não esteve nos Natais, nos dias de Páscoa ou em outras datas anuais. Também não esteve em seu casamento e tampouco nos dias em que os netos nasceram. Não fez mais os bolos de aniversário, não esteve em seus 30, nem nos 40, não estará nos 50... Em breve a mãe comemoraria 64 anos, mas parou nos 52.”


A órfã de mãe sou eu.


Por muito tempo eu senti que o que era dela também era meu. O fardo, a aparência, o jeito de ser, de pensar e solucionar, de estar e assumir.


Nesse tempo, fui acumulando pensamentos e reflexões e me livrando das lágrimas que, de frequentes, passaram a ser esporádicas. Fui vivendo e lutando em meio ao luto, resolvendo o que era meu e me libertando do que era dela.


Perdi o medo de morrer como ela. Honro o que ela me deixou e sigo com o que ela não quis ou não pôde ter, mas que eu posso, quando, como e se eu quiser ter.


Passo a passo, eu li, escrevi, chorei sem falar, tentei falar e chorei, até que passei a falar sem chorar.


Consegui me despir da imagem de ter “puxado” minha mãe para encontrar nela o que eu podia escolher ser meu.


Silenciei o barulho de fora para ouvir o que vinha de dentro de mim. Descobri que ela não era perfeita como eu a via e que seus defeitos e erros foram importantes para eu me tornar quem sou. Inclusive, sua tão dolorida ausência me refaz a cada novo dia.


Hoje ela é lembrada e celebrada em muitos momentos, em todos os bolos, a cada encontro com pessoas queridas, em uma simples costura em sua máquina herdada. E eu agradeço por todas as vezes em que senti e sinto que ela está espiritualmente do meu lado.


Estamos sempre conectadas.


Eu aqui e ela exatamente onde deve estar.

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